A palavra Liberdade tem uma notável conotação laudatória. Por esta razão, tem sido usada para acobertar qualquer tipo de ação, política ou instituição considerada como portadora de algum valor, desde a obediência ao direito natural ou positivo até a prosperidade econômica. Os escritos políticos raramente oferecem definições explícitas de Liberdade em termos descritivos: todavia, em muitos casos, é possível inferir definições descritivas do contexto. O conceito de Liberdade se refere com maior freqüência à Liberdade social. Esta conceituação precisa ser bem discriminada com relação a outras significações da palavra, quer em sentido descritivo, quer em sentido valorativo. As definições descritivas de Liberdade caracterizam situações identificáveis empiricamente e podem ser aceitas por qualquer pessoa, independentemente dos pontos de vista normativos de cada um no que diz respeito à Liberdade (§§ I-IV). A Liberdade em sentido valorativo (§§ V-VIII) é utilizada mais a nível de exortação do que de descrição; conseqüentemente, apresenta diferentes significações, conforme os diferentes modelos éticos que inspiram os autores. O conceito de Liberdade interpessoal ou social se refere às relações de interação entre pessoas ou grupos, ou seja, ao fato de que um ator deixa outro ator livre para agir de determinada maneira. Este conceito precisa ser definido fazendo-se referência a outra relação de interação, a de não-Liberdade interpessoal ou social. I. NÃO-LIBERDADE SOCIAL. — Com relação ao ator B, o ator A não é livre para realizar o ato x, se e somente se B torna impossível para A lazer x, ou se fazer x pode implicar sanções para A. “B torna impossível para A fazer x” significa que B realiza determinada ação y tal que, se A procurasse fazer x, sua tentativa fracassaria. Negando o passaporte a um cidadão, o Governo, na prática, o torna incapaz de viajar para o estrangeiro, e portanto não-livre para realizar tal ação. Com relação aos Estados Unidos, a China comunista é não-livre para conquistar Formosa e vice-versa, uma vez que, com muita probabilidade, as forças americanas impediriam que uma ou outra potência invadisse a adversária. Se a Ku Klux Klan não permite, recorrendo ao uso da força, que os negros entrem numa escola pública, estes se acham não-livres para realizar tal ação com relação ao Governo. “B aplicará sanções se A fizer x” significa que, se A fizer x, B faria algo, y, que modificaria para pior a situação de A. As sanções governamentais contra atos ilegais não passam de um exemplo de punição entre os muitos tipos de não-Liberdade social. Com relação a um sindicato, a empresa é não-livre para recusar de terminadas vantagens, se o primeiro resolver organizar piquetes diante da segunda. Com relação aos vizinhos, cuja tendência é marginalizar os não conformistas, os moradores de determinado conjunto habitacional de periferia são não-livres para se afastar de normas de conduta não escritas. Fonte: Dicionário de política I Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino – Editora Universidade de Brasília, 1 la ed., 1998